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Pobres Criaturas: surpreendente é o adjetivo que define

Denso, interessante e surpreendente. Pobres Criaturas, de Yorgos Lanthimos, entrega muito mais em sua subtrama do que jamais poderia imaginar quando sentei na cadeira do cinema.

Ao que tudo indicava, estávamos diante de um filme de Frankenstein. Criaturas criadas para serem excêntricas, dos animais de estimação à “filha” do doutor. Tudo parecia ser, na realidade, um grande experimento. Contudo, ao que a trama ia rodando, percebi meu engano. Notei que imaginei pouco sobre aquele enredo. Era muito mais.

Bella Baxter (Emma Stone) é trazida de volta à vida por Dr. Godwin Baxter (Willem Dafoe). Observada de perto pelo doutor e por seu pupilo, o estudante de medicina Max McCandles (Ramy Youssef), Bella pouco pode explorar.

E aí entra na história o ambicioso advogado Duncan Wedderbum (Mark Ruffalo), que vê na jovem ingênua uma chance de fazer dela o que bem quiser, caso prometa uma viagem e uma chance de conhecer o mundo.

Contudo, é a partir desse momento que vemos um despertar belíssimo de uma jovem que descobre, a partir de suas curiosidades, que o mundo é muito maior que seu quarto. É belo, interessante, perigoso e intrigante.

É a partir da jornada de Bella, que sai, por aí, tentando desvendar o que é a vida que podemos pensar nas nossas próprias vidas e o quanto seríamos mais felizes se pudéssemos ser apenas nós mesmos. Ou talvez possamos? Essa é a maior questão que fica em nossas cabeças quando o filme termina. Quem somos sem as amarras da sociedade, do nosso próprio preconceito e da nossa vontade de agradar às pessoas? Onde estaríamos se seguíssemos apenas o nosso ímpeto?

E não são apenas nos questionamentos que o filme é eficaz. Toda sua sutileza está posta em análises e diálogos. O doutor Godwin é apelidado de “Doc God”, o que, numa tradução literal para o português, seria “doutor Deus”. Willem Dafoe brinca realmente de Deus transformando animais, trocando órgãos e se realizando em suas salas de cirurgia. Tudo para ele é um grande experimento e o apelido casa muito bem com sua pretensão. Dafoe tem excelentes personagens em seu currículo e esse, com toda certeza, é mais um deles.

Contudo, o grande destaque da trama é Bella. Emma Stone consegue fazer uma personagem crível e fantasiosa ao mesmo tempo. Seu crescimento é nítido, sua gana pelo mundo está em seus olhos e toda a cena é dela. Nos afeiçoamos por Bella desde o primeiro momento. Cativante, esperta e divertida, esse papel rendeu um Globo de Ouro à Emma e deve trazer um belo Oscar para a atriz. Com toda certeza, merecido.

A falta de encaixe de tempo e espaço também faz muita diferença nesse filme. Não sabemos se estamos na época de Frankenstein ou se é um período moderno em que bondes flutuam pelos céus. E isso nos deixa cada vez mais intrigados.

A direção de arte e a fotografia são adicionais que enchem os olhos e nos transportam para uma história visualmente linda. Tudo é bem feito e a mistura do clássico com o futurista causa uma reação de estranhamento necessária. O figurino de Bella Baxter pode lançar moda por aí. As mangas bufantes poderão estar em volta em breve.

Pobres Criaturas é surpreendente. Denso e fantasioso. Importante e divertido. Traz uma excelente discussão sobre feminismo, empoderamento, mas, principalmente, sobre barreiras invisíveis. Bella faz com que, cada vez mais, ficamos com a vontade de ser quem somos.

Veredito da Vigilia

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