O Quarto ao Lado, de Almodóvar, é contido e poético
Cores e dramas sempre permeiam a obra de Pedro Almodóvar. O consagrado cineasta espanhol volta às telas grandes com um longa, após sua incursão por curtas-metragens. O Quarto ao Lado propõe uma conversa bela e profunda sobre luto e o findar da vida.
Tilda Swinton é uma velha conhecida do diretor. Foi com ela que Almodóvar fez seu primeiro teste em inglês em A Voz Humana. Dessa vez, ela se junto a Julianne Moore e a química das duas funciona muito bem.
Tilda é Martha, uma jornalista de guerra com câncer em estágio avançado. Ingrid, sua colega de redação por anos, descobre a doença e, após um tempo significativo de separação, ela procura a amiga. A partir daí, vemos uma delicada relação de amizade sendo redescoberta.
É preciso entender um ponto crucial aqui. Em inglês, Almodóvar se torna menos visceral. Não temos sangue, suor e pouquíssimas lágrimas. A pungente Penélope Cruz, que costumamos ver em filmes do diretor, dá espaço para suas protagonistas contidas, porém também excelentes.
Em O Quarto ao Lado, é uma importante relação feminina de amizade que ocupa espaço no roteiro e rouba a atenção do espectador, que fica vidrado, em deleite, durante 107 minutos. A química entre as personagens, que, em nenhum momento, se torna sexual, é incontestável. Tilda e Julianne estão entregues aos papéis.
O Quarto ao Lado venceu o Festival de Veneza e, além de ser uma ótima obra cinematográfica, traz uma discussão muito bonita sobre a vida e a morte, adicionado à importância das amizades femininas em nossas vidas. Até quando devemos viver? E essa é uma escolha nossa? Será que devemos continuar vivos apesar de prognósticos ruins? Ou ter uma morte digna quando estiver cansado não seria muito mais importante para driblar o sofrimento? Essas são perguntas que me fiz ao sair da sala de cinema.

Além disso, me questionei, por muito tempo, quem seria a amiga que estaria ao meu lado nesse momento difícil. E ainda mais: me questionei se eu sou a amiga que pode ser a opção caso alguém precisasse de apoio. O medo atroz da morte que Ingrid tem não impediu de ser a melhor amiga que poderia ser para alguém. Porque ela entendeu o seu local na amizade.
Apesar de ser livremente inspirado no livro O que Você está Enfrentando, de Sigrid Nunez, existe Almodóvar em todos os enquadramentos, em toda arte e em todo cenário. Inclusive, no final do filme. Apesar de se passar em Nova York, o longa não se rende ao delírio estadunidense do final heroico. Ele se mantém dentro da premissa. Dentro dos encontros e desencontros da vida.
A fase mais reflexiva de Almodóvar rende diálogos profundos e poéticos e um olhar importante sobre o findar da vida.
O Quarto ao Lado é visualmente lindo, conta com excelentes atuações e tem uma história reflexiva que nos faz aplaudir o bom cinema.