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No polêmico Benedetta, Paul Verhoeven faz crítica com ares de paródia

Chega ao Brasil no dia 13 de janeiro Benedetta, novo filme de Paul Verhoeven. Sim, ele mesmo. O responsável por Robocop (1987), Instinto Selvagem (1992) e Showgirls (1995), agora nos apresenta um filme de época, envolvendo temas e uma história real polêmica: uma freira católica, “mística” e lésbica que viveu na cidade de Pescia na Italia, na época da Contrareforma. 

Com uma pegada muito diferente do que vimos nos filmes e na proeminente carreira do diretor, temos em Benedetta um drama com requintes de paródia, ao mesmo tempo que toca em assuntos como charlatanismo, hipocrisia, e por óbvio, temas de uma época em que as mulheres realmente não tinham voz.

O ar europeu da carreira de Verhoeven, longe do cinemão de Hollywood parece não combinar muito com o que foi o ápice de sua linha de cinema de choque, onde por mais que seus filmes tivessem uma boa camada de entretenimento, ainda possuiam um bom tecido crítico, que por vezes passava batido pelo grande público. Público este que aos poucos foi se distanciando de sua obra, e, de quebra, o próprio cinema pop norte-americano de exportação, que perdeu uma boa dose de originalidade por trás das câmeras. Por tudo isso, aportar em Benedetta é uma experiência um tanto peculiar.

Logo ao entrar no convento, Benedetta (Virginie Efira) passa a ter visões de homens que tentavam matá-la. Mais do que isso, certas visões envolvem o heroísmo de Jesus, que sempre a salva. Os sonhos, normalmente terminam com algum envolvimento erótico entre eles. Essas visões, então, a cercam com um ar místico, já que ela relata muitas dessas visões, mas sempre omitindo seus desfechos. Ela então passa a ser vista como um grande canal de comunicação e das mensagens de Deus. Como essas visões e consequentes “crises” em público passam a crescer, Benedetta ganha em seu quarto a companhia de Bartolomea (Daphne Patakia). Juntas no quarto, elas passam a ter uma relação muito íntima e perturbadora para a época, e, evidentemente, para um Convento.

Virginie Efira e Paul Verhoeven no set de Benedetta

É interessante acompanhar a história, principalmente sem ter qualquer noção de como ela termina. São vários os caminhos que se pode imaginar durante a evolução da história, mas, certamente será complicado de prever o que realmente vai acontecer. A todo momento temos um misto de que algo explosivo vai se desencadear, jamais sabendo se será positivo ou negativo para as protagonistas. As atrizes que interpretam Benetta e Bartolomea conseguem mesclar de forma muito contundente relacionamento que vivem. Ele não é uma paixão, tão pouco fica somente vinculado ao sexo. É um jogo entre as duas. Virginie Efra, como Benedetta, entrega carisma e ares que passam do messiânico ao de embuste, o que colabora com o um ar de paródia, ou mesmo de chacota, que o filme estranhamente passa a nos contar. Já Daphne Patakia traz um ar mais malicioso para a relação. Elas são cercadas de perto pela Madre Superiora, a Madre Felicitá, interpretada pela brilhante Charlotte Rampling (Duna), mas não que ela esteja tão inspirada assim por aqui. Completam o elenco principal Hervé Pierre (Lupin) e Lambert Wilson (Matrix Resurrections).

Benedetta polêmica
Virginie Efira consegue sair do ar de seriedade e misticismo para o de uma impostora barata, e vai te deixar com sérias dúvidas

O roteiro assinado por Verhoeven e David Birke, adaptando do livro “Immodest Acts: The Life of a Lesbian Nun in Renaissance Italy”, da historiadora inglesa Judith C. Brown, fez com que o filme fosse exibido no Festival de Cannes, entre outros festivais ao redor do mundo, tendo sido premiado pelo Hall of Shame do Women Film Critics Circle Awards, que resumiu a obra como um filme sobre uma das primeiras feministas da igreja sendo reduzidas em um pornô softcore. E a bem da verdade, essa pode ser realmente uma das melhores interpretações para o longa, afinal, se era pra evidenciar algum tipo de protagonismo em Benedetta, ela aqui mais pareceu uma impostora do que qualquer outra coisa.

E o vai-vém entre crítica à hipocrisia, igreja e outros quetais acaba se perdendo em Benedetta. Paul Verhoeven, no final das contas, não soube dosar tão maliciosamente quanto sua personagem principal, os tons do filme, que ora passa um ar de imponência, outra cai em um humor que mais parece ter saído de um filme inglês. Por tudo isso, Benedetta, como falei anteriormente, acaba por ser uma experiência muito peculiar.

Veredito da Vigilia

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