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Jessica Jones | Crítica da 2ª temporada

O sucesso de Jessica Jones é justo e necessário. A primeira temporada (lá de 2015, faz tempo, né?) foi incrivelmente envolvente e diferente de tudo que já tínhamos visto nas adaptações de quadrinhos para a TV. Com méritos, figura entre as melhores temporadas da parceria Marvel e Netflix. O trabalho para fazer com que a segunda temporada fosse melhor, era uma tarefa quase inglória. Portanto, não é de se espantar que o novo arco fosse arrefecer. E arrefeceu. Nada tão ruim quanto a primeira temporada de O Justiceiro e Os Defensores, mas os novos 13 capítulos de Jessica ficam devendo em vários aspectos. E vamos tentar repassá-los pelos próximos parágrafos. Mas não se desespere. Vamos falar também dos pontos fortes. E claro, das pontas soltas. Afinal, uma terceira temporada já fica evidentemente jogada na nossa cara.

Os primeiros episódios são basicamente um aquecimento. E quando achamos que a trama vai para um lado, ela vai mudar completamente de rumo. Jessica (Krysten Ritter) começa a revirar o seu passado e o misterioso laboratório que mudou sua vida para sempre. E para isso ela sempre terá o impulso da maior amiga Trish Walker (Rachel Taylor). São episódios mornos, e vamos aos poucos percebendo que a intrincada e marcante narrativa vista no arco de Jessica contra Kilgrave vai ficando, lamentavelmente, cada vez mais distante. Temos sim a volta de temas latentes e marcantes e vários recados dentro dos textos de cada episódio. “Não aceito não como resposta!”, diz um dos novos (e ruins) antagonistas, enquanto Jessica responde: “Uma frase típica de um estuprador”. Não à toa, Jessica hoje é símbolo do empoderamento feminino. E isso fica evidente também na produção. Todos os 13 episódios são roteirizados e dirigidos por uma competente equipe de mulheres. Mas, assim como vem sendo uma tônica recorrente nas séries da Marvel com a Netflix, a produção vem caindo no quesito de encantar o público.

O fato mais marcante desta temporada talvez seja não termos um vilão tão poderoso (em todos os sentidos) quanto Kilgrave (David Tennant). E não por acaso, o episódio em que ele volta para a trama, é o melhor de todos. David Tennant rouba a cena, mesmo em poucos takes. Pior que isso, é termos um vilão (uma vilã, no caso), que pouquíssimo cativa, lembrando os piores momentos da série Agentes da S.H.I.E.L.D., tanto nas coreografias quanto nas maquiagens. E quando cito a série da ABC, me refiro mais especificamente às primeiras temporadas, depois ela melhorou bastante. Assemelham-se também aos piores momentos de Agentes da S.H.I.E.L.D. quando temos envolvido um cientista que passou a vida criando seres estranhos em laboratórios pra lá de clandestinos. Ainda que uma pequena pista conecte esse laboratório à rede criminosa que sempre volta para as tramas de Hell’s Kitchen apareça em um momento um tanto quanto isolado (precisa ser ninja pra perceber). E tudo isso aos poucos vai levando Jessica Jones a situações que seriam o gancho entre os capítulos. Aquele momento que serviria para cativar o público. Mas, infelizmente, eles foram feitos de forma tão isoladas um do outro que temos nossa expectativa quebrada pelos créditos finais dos episódios. Vamos ver a continuação de determinada cena no próximo, certo? Não, infelizmente isso será um ledo engano. Um acúmulo de oportunidades perdidas.

A nova temporada também desfaz por completo o #TeamJessica. Seus melhores amigos e companheiros estão sempre se dividindo, com motivações duvidosas que, novamente freiam a narrativa. As cenas de ação também são escanteadas. Vemos os poderes de Jessica muito raramente, e os recursos de seus grandes pulos estão cada vez menos empolgantes. Trish e Malcom oscilam bons e maus momentos, mas não seguram a onda tão bem como vimos antes. Inclusive parece que pouco aprenderam com tudo que passaram num passado recente. Ao invés de crescer, parece que os personagens ficaram menos carimbados. Algumas das atitudes deles e ações pontuais ficam estranhamente sem qualquer conexão com o que está acontecendo.

A Jessica que salvou um pouco da lavoura em Defensores continua bem, mas sua sina é ter a vida destruída e bagunçada das formas mais desgraçadas. Outro novo personagem Pryce Cheng (Terry Chen) não se faz justificar em quase nenhuma de suas ações, embora tenha uma lacuna importante deixada para o futuro. É o antagonista que irrita, mas longe da forma arrepiante que tivemos anteriormente. Jeri Hogarth (Carrie-Ann Moss) é excelente em seu papel, embora ainda ocorram alguns apelos quanto a questão de sua sexualidade. Lamentavelmente jogam pro ar um arco dramático dela, explicando que ela caiu em um golpe mais barato que trote por telefone.

O que deixa as coisas ainda menos animadoras é o hype que a Netflix vem criando em torno de suas séries. É uma campanha excelente de marketing que nos faz viajar, mas na hora da prática, as coisas ficam para trás.

Mas e aí, não temos pontos fortes?

Calma, nem tudo está perdido por aqui. Principalmente pelas referências aos quadrinhos e alguns easter-eggs. Os mais engajados vão perceber boas ideias de que alguns diálogos podem inserir uma interessante raça alienígena. A frase clássica do Homem-Aranha também fica presente em algumas ocasiões e até é desconstruída pelo sofrimento que os poderes trazem para aqueles que até então viviam normalmente. Nem sempre ter um super-poder é necessariamente um dom. E isso fica explícito na nova vilã e na fissura de drogada de Trish. Aliás, Trish também é um destaque interessante quando mostrada em seu passado. Ele era praticamente a Britney Spears de sua época. Mais alguém fez essa relação com a cantora teen?

A Jessica beberrona que conhecemos também mantém suas características. Um whisky ou bourbon estão sempre à disposição. O fato de que ela está sempre se dando mal também é um agravante interessante. Todas as encrencas que ela se mete tem realmente consequências muito graves, e principalmente para ela. Se existe alguma heroína traumatizada no mundo dos quadrinhos, seu nome é Jessica Jones.

O clima da série se mantém no nível interessante de subúrbio norte-americano (mas os efeitos especiais ainda estão de lascar). Todo o contexto de Hell’s Kitchen e seus arredores estão tão legais quanto nas temporadas anteriores. O novo zelador e vizinho Oscar (J.R. Ramirez) traz um alívio para um conturbado ambiente. E seu filho Vido (Kevin Chachon) é, obviamente, fã dos super-heróis da Marvel.

No final das contas, a nova temporada de Jessica Jones acaba ficando num meio termo. Não se arrasta tanto quanto seus pares da Netflix, mas perde e muito em relação à sua estreia, provando mais uma vez que a Marvel precisa pensar melhor em como lidar com seus vilões na TV e no cinema. A morte nessas mídias é muito mais delicada. Como justificar uma volta de personagem assim, não é mesmo? Que falta que faz um Kilgrave.

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