“Eike: Tudo ou Nada” é totalmente diferente do que você espera
Eike: Tudo ou Nada conta a trajetória de Eike Batista, o brasileiro que chegou a figurar entre os mais ricos do mundo
Me lembro exatamente do dia em que meu pai resolveu me apresentar Ilha das Flores, de Jorge Furtado. Eu devia ter cerca de dez anos e aquele curta me deixou realmente impactada. E não foi apenas pela temática. Fiquei vidrada na forma de narrativa. Como tudo ia e voltava para o mesmo ponto. Talvez meu pai não saiba, mas aquele momento, ele me deu o empurrão que faltava para que eu me apaixonasse por cinema e pelas suas possibilidades. Só que, desde cedo, entendi que cinema precisava ser bem feito. Reutilizar uma ideia marcante, como essa da retórica de Jorge Furtado requer cuidado e, acima de tudo, muita assertividade. O que não temos no início de Eike: Tudo ou Nada. E não teremos até final.
Sua abertura não simula apenas Jorge Furtado e, ao seu desenrolar, vemos muitas e muitas referências ao cinema nacional e internacional. O que não seria um problema, caso fosse bem executado. E em Eike: Tudo ou Nada falta. Falta liga, falta malemolência, falta borogodó.
A história, protagonizada por Nelson Freitas, em nenhum momento aborda a parte que talvez (veja bem, “talvez”) interessaria o grande público. Os escândalos de traição, a sua vida amorosa, seus filhos aprontando. Nada disso aparece. Luma de Oliveira e um pouco das polêmicas de Eike aparecem em uma cena que tenta recriar Fellini. Uma espécie de circo – literal – é montado e a belíssima Carol Castro aparece como uma sedutora e sexy Luma.
Dida Andrade e Andradina Azevedo criam uma história para o empresariado bater palma. O arrojado Eike, que nadava muito na sua infância na Alemanha, agora nada em dinheiro. E em ego. Afinal, se isso era para ser um enredo emocionante de quem tentou e ousou, parece apenas um grande delírio megalomaníaco de um rico mimado desde criança.
Jorge Furtado, Felline e agora José Padilha. Afinal, temos um narrador no longa. Benigno (Thelmo Fernandes) é o braço direito de Eike e tem o papel de conduzir o público naquela história sem sal e sem açúcar. Freitas emula Selton Mello e fala basicamente sussurrando o filme inteiro. Uma palestra empresarial em ASMR (não entendeu, dê um Google).
Como falei anteriormente, o recorte da história é questionável. Totalmente faixa branca. Um Eike cheio de boas intenções que dá um passo maior que a perna. Não seria melhor colocar um empresário que ama dinheiro e que quer ficar cada vez mais rico, mais poderoso e figurar na lista dos homens mais ricos do mundo?
Em algumas cenas, aparece uma família ludibriada por comprar ações. Mas as atuações são tão fracas que ofuscam toda intensidade do que a ideia tenta ser. Aliás, atuações não são o forte desse filme. Seus personagens são medianos, a caracterização não acompanha a época e os cenários são requentados. Parece que o filme foi feito com baixo orçamento ou com desleixo. Em uma cena específica, o corte de cabelo de Benigno e seu penteado são tão fora de tom que é quase impossível prestar atenção em outra coisa.
Impossível também é não notar a trilha sonora. Com algumas músicas populares brasileiras, Eike: Tudo ou Nada parece que se esforça para comparar o empresário aos brasileiros e brasileiras que, de sol a sol, saem das suas casas para trabalhar e conseguir o sustento das suas famílias. Como se um empresário multimilionário cheio de ego que ludibriou uma grande quantidade de pessoas, cometeu diversos crimes pelos quais ainda não pagou e arruinou economias de famílias fosse um cidadão comum e trabalhador. Que esse seria o jeitinho brasileiro de um alemão seduzido por Carnaval.
Eike: tudo ou nada estreia na quinta-feira, dia 22 de setembro e não vai entregar o que você espera. É um filme chapa branca sobre e para empresários.