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Cobra Kai precisa acabar! Crítica da terceira temporada

Caiu no clickbait? O editor pirou? Quer chamar a atenção então pendura uma melancia na cabeça? Nenhuma das anteriores. Essa crítica da terceira temporada de Cobra Kai é na verdade uma grande ode à série, que, de forma incrível, resgatou uma esquecida propriedade intelectual dos anos 80 e trouxe para as novas gerações aquela aura de aventura de sessão da tarde quase que perfeita. O “quase” na verdade, já é um elogio demasiado, mas, vamos lá, tudo será explicado nas próximas linhas.

Cobra Kai, como você já deve saber, se passa 30 anos depois do torneio de All Valley (1984) que alavancou a vida de Daniel LaRusso (Ralph Macchio), e, ao mesmo tempo, fez com que seu adversário Johnny Lawrence (William Zabka) caísse em desgraça. Agora um bem sucedido vendedor de carros, Daniel tem dois filhos, mora em uma mansão com a esposa, enquanto Johnny vive pulando de emprego em emprego, até que resolve reabrir seu dojo, ressuscitando não só o Cobra Kai, mas uma rivalidade de uma vida inteira. Sua família é instável, sua ex-mulher tem problemas com bebidas e seu filho não o reconhece como família. Bom, se você chegou aqui e ainda não está familiarizado com isso e também o que a trilogia Karatê Kid mostrou em A Hora da Verdade, A Hora da Verdade Continua e O Desafio Final, vale a pena correr atrás das obras e beber da origem de tudo que se passa, agora na Netflix.

Xolo Maridueña é Miguel, quase um filho para Johnny Lawrence (William Zabka)

Cobra Kai iniciou como um projeto do YouTube Originals, com duas temporadas que mesclam a nostalgia com uma nova trama (2018 e 2019), passando o bastão do karatê para uma nova geração e tendo como orientadores Daniel e Johnny. Mas o mais legal é jogar luz sob a ótica de Johnny, até então um vilão clássico. Cheio de referências aos anos 80, a série ganhou fãs, mas não foi o suficiente, sendo descontinuada pelo YouTube. A Netflix, que vive (e já emplacou) de sucessos que bebem diretamente dos anos 80, não perdeu tempo e resgatou a série. A terceira temporada é a primeira totalmente original Netflix, mas também com o selo da Sony Television. E com o olhar que sai da trama mais maniqueísta entre bem e mal, a série nos pega em vários momentos fazendo torcer para diferentes personagens. Cada um deles tem um importante background e as ações são plenamente compreensíveis. Até mesmo o mais desprezível deles (o excelente resgate de John Kreese, interpretado pelo veterano Martin Kove) terá seus respiros de compreensão por parte do público. E saindo das áreas pretas e brancas, oscilando as iniciativas em zonas cinzentas, tal qual a nossa realidade hoje em dia, vemos a trama avançar de forma simples e direta, quase óbvia, mas que conquista exatamente por esta simplicidade. Cobra Kai é honesta em sua proposta e nunca vai ter a pretensão de ser uma mega trama cheia de metáforas. Essa honestidade quase novelesca e bem farofeira é o que lhe dá brilho para se tornar o sucesso de audiência que foi entre 2019 e início de 2020. A Netflix puxou para si uma queridinha que não teria muita chance no desconhecido serviço pago do YouTube.

Martin Kove é John Kreese, o vilão perfeito que amamos odiar!

Na primeira temporada conhecemos Miguel (Xolo Maridueña), Amanda LaRusso (Courtney Henggeler), Robby (Tanner Buchanan) e a nova geração do Karatê juvenil. Tão logo são apresentados os personagens, já fica fácil traçar o destino de cada um. Com exceção de algumas surpresas na segunda temporada, a terceira finalmente nos joga para o conflito que se imaginava lá atrás. As sementes brotaram, e agora os embates não são mais evitáveis. O espaço de personagens, mesmo que secundários, é bem explorado, o suficiente para o protagonismo da série inteira não cair sob os ombros de somente um deles. É uma vitória difícil de se alcançar, mas a série equilibra isso de forma bem eficiente.

Amanda e Miguel: a gente sabe o que vai acontecer desde o primeiro episódio

Vale ressaltar que o elenco juvenil não é nem de longe talentoso. Algumas interpretações ficam bem aquém do esperado, mas Cobra Kai ganha na simpatia pela liga de todos os seus elementos. Os personagens podem ser mal escalados e as coreografias bem medíocres, mas tudo funciona muito bem. Aliás, nesse aspecto, assistir Cobra Kai na versão dublada é uma dica muito importante: temos as vozes originais dos filmes, o que nos deixa mais rastros de nostalgia e fazem alguns bordões antigos ganharem ainda mais força (ou timing de comédia). Pode beirar o tosco, mas é aquele tosco que a gente adora. A violência nas lutas, no entanto, às vezes extrapola o que encontramos em uma escola regular (pelo menos eu acho!).

Eli, o “Falcão”, interpretado por Jacob Bertrand também tem espaço na história

Sempre entrelaçando o passado de Daniel e Johnny, a terceira temporada traz surpresas interessantíssimas para o enredo, fazendo até mesmo com que aqueles episódios que poderiam ser menos atraentes ganhem peso. É importante dizer ainda que Cobra Kai é o tipo da série fácil de se maratonar. Aliás, é até agradável maratonar, sem que se perca momentos importantes. Nesse aspecto, vemos um pouco mais do passado de Daniel e Johnny batendo à porta, assim como uma criação de pano de fundo inédita para John Kreese, o vilão perfeito da série. Impossível não ficar com raiva em cada vez que ele abre a boca.

Mas com tantos elogios, que raios de título e introdução da crítica foi aquela? Bom, com todas as cartas já na mesa, fica também previsível que as histórias possam estar se esgotando. E como sabemos, no mundo das séries, prolongar histórias ou tramas em demasia pode gerar constrangimentos futuros. Por tudo que construiu desde a primeira temporada, tudo indica que a quarta temporada será sim a última. Seria o final perfeito e o payoff de tudo que já foi construído, colocando um fim na rivalidade entre Daniel e Johnny e consagrando uma vitória (já previsível) contra o novo dojo de Kreese. Por isso, Cobra Kai precisa acabar. Para terminar por cima, no seu auge, e nos fazendo agradecer ainda mais por essa mescla de nostalgia com farofa, hard rock e discursos atuais que tanto deu certo. Acabe agora, e vire outro marco entre a cultura pop, assim como foi com Karatê Kid lá em 1984.

Que o Sr. Miyagi nos ouça!

Veredito da Vigilia

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