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Aos Pedaços: a arte de Ruy Guerra no Festival de Gramado | Crítica

Uma das premiére mais aguardadas da 48ª Edição do Festival de Cinema de Gramado foi “Aos Pedaços”, novo filme de Ruy Guerra. O primeiro motivo é o retorno do diretor, considerado uma lenda viva do audiovisual brasileiro, após o filme “Quase Memória” de 2016. Agora, aos 89 anos, Guerra ataca com um filme de arte intimista, perturbador e inventivo. Com três ou quatro personagens e poucas locações, ele nos conta a história de Eurico Cruz (Emílio de Mello) e seus devaneios após receber um bilhete que anuncia sua morte. Completam o elenco Simone Spoladore (Magnífica 70), Christiana Ubach e Julio Adrião.

Aos Pedaços, apesar de toda sua força, fica enfraquecido por ter entrado em uma edição “em casa” (exibida pelo Canal Brasil) do festival. Com sua atmosfera calcada em um clima noir, todo em preto e branco e com poucos respiros diferentes, certamente teria ainda mais impacto se assistido em uma sala de cinema, como manda o figurino. É o tipo de experiência difícil de reproduzir em casa, apesar da grande e valorosa chance de democratizar uma obra com uma exibição para todo o Brasil (e até mundo, se considerarmos a internet). Aliás, essa democratização também foi um grande acréscimo do festival, pois os painéis e coletivas com equipes de cada filme também estão acessíveis via internet. É um caminho sem volta para as futuras edições.

Um clima noir e excelentes interpretações em Aos Pedaços

Mas voltando ao filme, Ruy Guerra constrói sua arte em três excelentes atores, e faz com que sua estética toda trabalhe a seu favor. A interpretação de Simone Spoladore precisa ser exaltada, passando do riso fácil ao grito estérico em uma fração de milisegundos. Mas não se engane, Aos Pedaços é o tipo de filme que não faz o estilo comercial, precisando de que o público se desprenda dos formatos tradicionais das narrativas que ocupam 90% dos cinemas (quando abertos) em todo o mundo. A premissa é de que Eurico tem duas mulheres, em diferentes continentes, um desértico, outro paradisíaco, ainda que suas próprias residências, sejam idênticas. E ele sabe que vai morrer.

Guerra cria uma confusão mental no protagonista (ou nos protagonistas) que é refletido em tela, e provavelmente no espectador. Espaços, lembranças, vivências e sentimentos são jogados e batidos no liquidificador. E ao despejar isso no vídeo, fica a cargo de quem assiste separar esses ingredientes para entender todos os aspectos colocados. O sabor é incerto. É de certa forma angustiante acompanhar tudo que se passa na tela. E muitas coisas estão mais no próprio texto do filme do que nas próprias imagens colocadas. Méritos também para roteirista que acompanha Guerra, Luciana Mazzotti.

Gosta de cinema de arte? Esse filme é todo seu!

Veredito da Vigilia

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