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Álbum em Família: filme da pandemia desconstrói Nelson Rodrigues

É inegável que a pandemia atingiu o planeta inteiro. O cinema, então, foi um dos setores sociais e econômicos mais afetados. Mas a mais fatal das crises da história da humanidade também impactou em como fazer cinema. E Álbum em Família, longa de Daniel Belmonte, é mais um desses casos. Baseado em uma peça de Nelson Rodrigues, o filme compõe a Mostra Competitiva do 49º Festival de Cinema de Gramado e foi exibido na noite de segunda-feira, dia 16 de agosto. A produção é uma grande brincadeira e desconstrução de um dos nomes mais lembrados da dramaturgia brasileira. A diferença é que a empreitada é cheia de camadas e meta-linguagem, sem o compromisso e amarras dramáticas que automaticamente nos cercam ao falar de Nelson Rodrigues. Álbum de Família é uma comédia pop feita em isolamento sem esconder isso em nenhum momento.

A ideia, desde cedo fica muito clara. Diretor, atores e figurantes estão cada um na sua casa sabendo que o filme todo será gravado do jeito que der, por eles mesmos, com o que eles tiverem ao seu alcance. Algo semelhante ao que vimos na série 5x Comédia, que também foi lançada este ano. A grande diferença é que a todo momento temos as explicações do que está e o que vai ocorrer, mesclando a interpretação fictícia de cada um dos protagonistas com uma segunda interpretação, que é a dos próprios atores interagindo e reagindo com o roteiro e proposta. Tudo isso permite, além da quebra da quarta parede, que a peça vire uma grande sátira, uma grande bagunça cinematográfica.

Além da interação dos atores com a peça e a ressignificação que cada um deles dá, Álbum em Família ainda acha espaço para uma crítica bem-humorada do próprio ofício de roteiristas, diretores e atores, que seguidamente reclamam do que estão fazendo e das propostas coordenadas pela produção. Ao mesmo tempo que isso acontece, vemos várias artes gráficas invadindo a tela e mostrando o que seria cada parte do roteiro. Isso contribui para a bagunça  já mencionada, ao mesmo tempo que vai deixar muita gente confusa com tantas dinâmicas e personagens indo e voltando a todo o momento.

Álbum em Família
George Sauma e Otávio Müller em cena, mas cada um na sua casa

No elenco de Álbum em Família temos o próprio diretor Daniel Belmonte, Otávio Müller, que já desfilou por Gramado no premiado Benzinho, Cris Larin, George Sauma, Eduardo Speroni, Kelson Succi e Dhara Lopes. Menções especiais também para as participações mais do que especiais de Renata Sorrah (em uma das melhores piadas do filme), Tonico Pereira, Lázaro Ramos, Valentina Herzage e Ravel Andrade.

Outra piada bem elaborada com Álbum em Família e esse vai-e-vém entre realidade e ficção, ou autoficção, é com a ideia de “família tradicional brasileira”. Não esqueçamos que ainda estamos falando de uma adaptação de Nelson Rodrigues, o que nos remete a falas como: “Nelson Rodrigues, sério? Se esse cara estivesse vivo já estaria cancelado, não tem como”. 

No final das contas, Álbum em Família e a ideia de reunir um grupo de atores ensaiando e gravando a peça virtualmente já é uma grande vitória. Ganhar um Kikito em Gramado então, já será épico.

Veredito da Vigilia

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