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Todo Dinheiro do Mundo | Crítica

Imagine ter que refazer grande parte das cenas de um filme que estava praticamente pronto. Pois é, essa é a história de Todo o Dinheiro do Mundo, novo longa do diretor Ridley Scott (Blade Runner, Alien), que estreia dia 1º de fevereiro no Brasil. Prevendo o boicote à sua obra, o experiente “regente de atores” mais do que rapidamente substituiu o ex-astro Kevin Spacey do filme após o escândalo envolvendo denúncias de abuso e pedofilia em seu nome. E olha que tudo indicava que Spacey iria figurar entre os seletos atores indicados ao Oscar. O lobby estava todo armado. Tal qual Gary Oldman em O Destino de Uma Nação, Spacey apareceria debaixo de uma maquiagem feita para lhe envelhecer. Mas o tempo de tolerar abusos na indústria do cinema parece estar acabando, e por isso, Scott colocou o também experiente Christopher Plummer na vaga dele. Resultado? Plummer já figura na lista de indicados a Melhor Ator Coadjuvante no Oscar de 2018.

Muitos se eriçaram depois de tudo isso. E muitos comentaram que era uma indicação tão somente para dar um recado claro à lista de abusadores de Hollywood, que cresce exponencialmente nos últimos meses. Mas para esses todos eu digo, ou tranquilizo: não é. Plummer está perfeito em sua interpretação e me arrisco a dizer que elevou e muito o nível do filme. E acrescento, Spacey provavelmente iria apenas repetir suas intervenções de Frank Underwood e de vilão odiado. E, veja bem, isso não chega a ser um demérito.

Sr. Avereza: Christopher Plummer está impecável no papel.

Plummer é John Paul Getty, ninguém menos que o homem mais rico do mundo na década de 70. E é ao redor de toda sua avareza, frieza e falta de noção por onde gira a trama, baseada em fatos reais. Depois de construir um império e mostrar que Getty basicamente é imbatível nos negócios (ele sempre vai sair ganhando), vemos seu filho John Paul Getty II (até o nome é de rico, Andrew Buchan) pedindo auxílio do pai para poder sustentar sua família. Com as conexões familiares reatadas, ele e sua esposa Gail (Michelle Williams) adentram um mundo diferente do qual estavam acostumados. Um mundo onde a riqueza tira toda a realidade da vida. E com isso, Gail tem seu marido consumido pela luxúria, drogas e tudo que o homem mais rico do mundo pode obter. Irreconhecível, ele passa a viver como um parasita. A família de comercial de margarina já não existe mais. Cabe a Gail tirar os filhos desse ambiente e tocar sua vida. Mas para isso, terá que passar pelos desejos de seu sogro. E ela não quer nada, apenas a guarda dos filhos. Dentro de um dos mais fortes impérios, ela sai, convicta de sua honra, fazendo questão de mostrar que nenhum dinheiro do mundo compra seus filhos.

Michelle Williams é a mãe abdicada

O que ela não contaria é que, anos depois, seu filho mais velho, John Paul Getty III (nome de rico, de novo) seria vítima de um sequestro que duraria meses. E por óbvio, o resgate é o principal empecilho, afinal, a fortuna não lhe pertence. É a partir daí que vemos um espetáculo regido pela frieza de Plummer contra a dedicação de Michelle Williams (que por sinal, não repete suas excelentes atuações). E no meio disso tudo, temos o negociador do multimilionário Fletcher Chase, vivido por Mark Wahlberg. A luta para recuperar o filho vai gerar consequências marcantes e quase inimagináveis. Tudo construído em uma encenação impecável dos anos 70, entre figurino, fotografia e locações.

Gail e Fletcher (Mark Wahlberg) em meio aos jornalistas/abutres

Embora um bom filme, Todo Dinheiro do Mundo não carrega nenhum frescor ou inovação. A trama flui, por vezes arrastada, mas sempre atenta aos detalhes que compõem a narrativa, fazendo suas conexões entre as linhas temporais do passado e do presente. A dramatização de uma família que tem tudo, mas não consegue chegar a um consenso de como ajudar um ente querido que passou pelas mãos de duas diferentes quadrilhas de sequestradores (isso mesmo!) é bem feita, mas é difícil se envolver de fato com profundidade. No final das contas, Ridley Scott contou uma boa história (mais uma), mas vai ficar difícil não lembrar do longa por tudo que envolveu a troca de Spacey por Plummer. E isso tira o brilho do motivo principal de se fazer um filme, que é basicamente contar uma história.

Mesmo assim, fico na torcida pelo Oscar do Plummer.

Veredito da Vigilia

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