Stranger Things 3: os irmãos Duffer seguem acertando | Crítica
A aguardada terceira temporada de Stranger Things estreou no dia 4 de julho na Netflix. E os novos oito capítulos dos amigos da cidade de Hawkins e seus estranhos acontecimentos continuam progredindo em uma escala cronológica. E com essa progressão, seguem as nítidas inspirações relativas aos anos 80, tanto no roteiro quanto na ambientação. O tempero especial da série segue acertando em cheio e pegando de jeito toda uma geração criada nessa época. Mas claro, também se ampara no carisma de seus personagens (nem todos) e investe forte na ação e até mesmo no gore. A terceira temporada de Stranger Things é fluida, agitada, cheia de novos monstros, batalhas e situações que conseguem manter três ou quatro núcleos distintos sempre em prol de uma só história. Mais colorida e vibrante, os irmãos Duffer conseguiram manter de forma orgânica tudo o que criaram, respeitando as idades, épocas e evoluções de mundo, sempre com o pretexto de deixar em segredo os maiores mistérios que desde a primeira temporada cercam Stranger Things. Os paralelos com tudo que era produzido na época são evidentes, mas apesar disso, nunca soam forçados. E esse talvez seja o maior segredo: embora os anos 80 estejam eternamente na moda, em Stranger Things, eles não são uma bengala para qualquer coisa, é uma viagem no tempo coerente em todos seus itens. É como se ela fosse realmente rodada nos anos 80.
Agora estamos em 1985 e o boom dos shopping centers está matando o comércio local. E tal qual a corrida entre Estados Unidos e Rússia (um clássico da vida), vemos que do outro lado do mundo uma outra organização segue exatamente os passos do que os norte-americanos faziam nas primeiras temporadas (primeiro paralelo entre época e roteiro). E não existe sequer um filme de ação dos anos 80 e 90 que não balizem suas ações na richa EUA x Rússia (pelo menos os que tenham o escopo internacional). Na cultura do Tio Sam, essa sempre foi uma desculpa genérica para inimigos. Funciona. A clássica “ameaça comunista”. E esse plot mostra o quanto a série também vem ganhando em produção e investimentos. Os cenários e efeitos especiais estão acima da média, tal qual um blockbuster da época.
Os personagens também merecem um destaque a parte. Provavelmente você vá estranhar o quanto as crianças cresceram. Mike (Finn Wolfhard), Lucas (Caleb McLaughlin) e Will (Noah Schnapp) estão realmente destoantes. A clássica época em que crescer não é assim tão fácil ou favorável esteticamente. E isso acaba impactando obviamente em seus comportamentos, afinal, adolescentes não são o tipo de gente fácil de se relacionar. No entanto, Dustin (Gaten Matarazzo) continua sendo um poço de simpatia e carisma. Sua dupla com Steve (Joe Keery) continua sendo um dos pontos altos. Já Eleven/Onze (Millie Bobby Brown) e Max (Sadie Sink) finalmente se unem e roubam a cena no aspecto da fofura, comportamento e mais referências. Jonathan (Charlie Heaton) e Nancy (Natalia Dyer) continuam iguais, sem grandes apelos. Enquanto Joyce (Winona Ryder) segue ganhando pontos como a mãe superativa.
O ponto negativo fica para o xerife Hooper (David Harbour) que, apesar de todo o apelo sentimental que seu personagem carrega, acaba virando um alívio cômico em demasia, destoando das primeiras temporadas e de seu passado triste. Ele replica o personagem Magnum (série dos anos 80 com Tom Selleck – segundo paralelo entre época e roteiro). Pontos positivos para os personagens novos. Robin, o novo crush de Steve, que tinha ficado bem no vácuo após o acerto entre Nancy e Jonathan, é interpretado por Maya Hawke (que estará em Era Uma Vez em Hollywood) e faz o tipo menina sagaz e inteligente, o total oposto de Steve, que faz o adolescente superficial (embora simpático). E Murray Bauman (Brett Gelman) o amalucado jornalista que fala russo. Pontos extras também para a irmã de Lucas, Erica (Priah Ferguson) que se somou muito bem à trupe Steve, Dustin e Robin. Por fim, Billy (Dacre Montgomery) está lá novamente com seu papel de malvadão, mas que dessa vez, não será só um antagonista da sociedade “humana”.
Os acontecimentos em Hawkins seguem um mistério. E depois de um novo respiro na vida dos personagens, ainda teremos o Mundo Invertido afetando seus destinos. Junto da já mencionada tirada entre EUA e Rússia, temos outros aspectos oitentistas replicados na narrativa (continue contando eles aí, por favor). O prefeito Larry Kline, interpretado por Cary Elwes (A Louca louca História de Robin Hood), faz o clássico canastrão, que está prejudicando a cidade (em função dos russos), mas não faz a menor ideia do que isso tudo pode acarretar. No pé dele, Hooper vai ser confrontado por uma réplica de Exterminador do Futuro/Arnold Schwarzenegger, em um personagem que mescla ainda um quase Dolph Lundgren. É possível enxergar nele também o T-1000.
O ritmo da série aumenta de vez a partir do quarto episódio. Aí temos a trama se desenvolvendo em vários locais. O Devorador de Mentes toma outras formas, e Billy será seu hospedeiro. A turma toda é jogada para a ação, sem qualquer tipo de enrolação. E com uma série de situações replicando ação oitentista, as motivações são suficientes para mover as peças no tabuleiro, sempre deixando em segundo plano os porquês de tudo aquilo estar acontecendo daquele jeito. Existem monstros, eles saem de um portal e estão em busca de Eleven. Lidar com isso é buscar a própria sobrevivência, apesar de poucas pessoas estarem percebendo que um monstro gigante está atacando a cidade. As consequências no entanto, são rapidamente mostradas no episódio final. De resto, há muitos mistérios em aberto em Stranger Things. Os irmãos Duffer seguraram mais uma temporada (que foi ótima, por sinal), mas há muito a responder. Ou não. Mas uma coisa é certa, desta vez as mortes e perdas do grupo vão ser muito mais sentidas do que as das temporadas anteriores. O episódio final é pra puxar os lencinhos.