Sicario: Dia do Soldado | Crítica
O tema de Sicario: Dia do Soldado, não poderia ser mais atual e amplo. Principalmente em função da política, que joga os Estados Unidos contra o México (e contra o mundo), as velhas guerrilhas que surgem nas fronteiras dos dois países, as constantes ameaças, a galhofa da construção de um muro separatório, e nos últimos meses, para aumentar ainda mais esse caldeirão, temos como agravante a trágica política que separa pais e filhos de imigrantes que buscam por melhores condições, lembrando cenas terríveis da Segunda Guerra Mundial. Tudo isso por si só, já traz muita atenção ao filme. E com razão.
Tudo começou em 2015, quando foi lançado Sicario: Terra de Ninguém. Foi quando o diretor Denis Villeneuve (Blade Runner: 2049, A Chegada) e o roteirista Taylor Sheridan iniciaram a saga. Na época com Emily Blunt (Um Lugar Silencioso), Benicio Del Toro (Vingadores: Guerra Infinita) e Josh Brolin (Deadpool 2), o filme foi indicado a três Oscar de categorias técnicas. Infelizmente, o segundo não terá a mesma sorte (pelo menos não nas categorias mais conhecidas). A tônica já explorava o duro relacionamento das polícias, gangues, milícias e cartéis que se utilizam das fronteiras das mais diversas formas e seus diferentes impactos. A maioria envolvendo tráfico de drogas. Em Sicario: Dia do Soldado, a pauta volta com mais força e veracidade, com o roteiro nas mesmas mãos, mas a direção não tão esperta, desta vez com Stefano Sollima. Perder um diretor em ascensão como Villeneuve pode ter sido determinante para uma melhor sorte de Sicario: Dia do Soldado.
O novo longa começa com tensão, mostrando novamente o conflito das fronteiras e a clara intromissão do governo norte-americano, não só no seu território, mas também, como costumamos ver, em outros continentes. E isso traz o filme para uma discussão fortíssima, arriscando mostrar o quão ruim são os pensamentos dos engravatados, que não poupam guerras para buscar seus objetivos. Nesse ponto, o filme começa com uma ótima levada e uma crítica escancarada e corajosa, deixando claro que em certos momentos é difícil diferenciar quem são os verdadeiros terroristas. Del Toro e Brolin encabeçam esse processo, com uma ponta do clássico Matthew Modine (Stranger Things) como um dos poderosos dos bastidores.
O arco inicial é tenso, visceral e mostra diferentes facetas do terrorismo. Com explosões, violência e sangue, temos ótimas cenas de ação. Muitas com grande impacto emocional e visual. A crueza que o tema precisa. Com os militares e milícias clandestinas, temos ainda o enlace com as vítimas. Mexicanos e norte-americanos entre eles, cada um com seus papéis, trabalhando com o que traz dinheiro. Dessa vez, o tráfico de pessoas do México para o Texas. Nada poderia ser mais marcante.
Brolin volta ao papel de Matt Graver, com a costumeira volúpia que vimos em outros papeis. Ele usa como poucos suas expressões e voz marcante para pontuar suas atuações. E aqui ele é novamente contratado para iniciar guerras com um viés político com cartéis do México. Nisso, quem também volta é Del Toro, como Alejandro. E os traumas do primeiro filme vêm com ele. Após uma equivocada ação com o sequestro da filha de um importante chefe de um cartel mexicano, a pequena Isabel Reyes (Isabela Moner, de Transformers: O último Cavaleiro, e que também será a Dora Aventureira) se vê no meio de um conflito político, grave o suficiente para começar outra guerra. De outro lado, vemos a relação de norte-americanos ligada direta ao tráfico de pessoas, lucrando com a chegada de imigrantes. Outra pauta corajosa.
Apesar de manter um excelente ritmo e variações entre ação, trama política e momentos de tensão, Sicario: Dia do Soldado acaba resvalando em seu último ato. É nele que certas escolhas podem incomodar logo após grandes surpresas. É uma espécie de bolo em que tudo foi feito com muito capricho, mas quando a cobertura de chocolate elevaria o doce ao patamar das delícias, ele é simplesmente servido quente e esfarelado. A expectativa é quebrada, e gera uma certa frustração. Ao mesmo tempo, nos leva a saber, que muito provavelmente, teremos a pauta retomada em um ou dois anos. Foi quase.