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O Escândalo: história real e realmente escandalosa | Crítica

O que acontece quando você reúne Charlize Theron, Nicole Kidman e Margot Robbie em um filme sobre um dos maiores escândalos da TV norte-americana? O resultado, com certeza é certeiro, abordando temas como abusos de autoridade, sexual, feminismo e a dura vida do mundo corporativo. Os ingredientes são vários, e bem conduzidos pelo diretor Jay Roach (Trumbo, e a trilogia Austin Powers), que foi levado à produção pela própria Charlize Theron. Apesar de um filme que toca forte na vida das mulheres, o roteiro é de Charles Randolph. O protagonismo feminino está todo na frente das câmeras. Como a própria Charlize mencionou em entrevistas: “Não haverá transformação se os homens não forem incluídos nela”.

É com as já indicadas ao Oscar Charlize Theron e Margot Robbie que temos a maior parte da trama, ainda que ela só seja levada a frente pela personagem de Nicole Kidman. E vale destacar, o roteiro é baseado em uma história real, onde a ousadia da jornalista Gretchen Carlson (Nicole Kidman) foi o estopim da revelação de uma longa história de abusos por parte do todo-poderoso fundador da Fox News, Roger Ailes, brilhantemente vivido por John Lithgow. Ele novamente se esconde atrás de uma pesada maquiagem, tal qual como Gary Oldman teve em O Destino de Uma Nação, ou ele mesmo como Winston Churchill em The Crown. Aliás, a maquiagem e o cabelo do longa são tão importantes que também tiveram a merecida indicação ao Oscar na categoria. Esse componente é tão marcante que é capaz de fazer você se perguntar se Charlize é mesmo Charlize. Se precisava disso? Bom, aí é outra história.

Para deixar claro: Charlize Theron e John Litghow são as pessoas nessa foto

O Escândalo (ou Bombshell, no original) é um daqueles filmes bons de se assistir. Em uma hora e 48 minutos, somos esmagados por uma onda de informações e conhecemos bem as personagens. Aliás, o elenco coadjuvante também merece o crédito. Kate McKinnon sai da sua costumeira postura de comediante e Allison Janney entrega uma discreta e importante (e quase literalmente) advogada do diabo. É interessante ver Kate – que mostrou recentemente em discurso no Globo de Ouro todo seu orgulho pela apresentadora Ellen DeGeneres e o que ela representa para as mulheres – sair de sua zona de conforto e se jogar em uma personagem que, mesmo tendo sua mesma orientação sexual, acaba se esquivando do papel de exemplo de luta. Pelo contrário, ela se esconde dentro da redação que mais representa o conservadorismo no mundo, mesmo que não concorde com nada que aconteça lá dentro. Tudo para manter o seu emprego.

Embate de posições políticas entre Margot Robbie e Kate McKinnon

A direção, logo no início, tenta emular o que vimos em A Grande Aposta (que também tem roteiro de Charles Randolph) com Megyn Kelly (Charlize Theron) fazendo as vezes de apresentadora não só do telejornal, mas do próprio longa. No entanto, a ideia é esquecida aos poucos, entrando em uma trama contada de forma mais tradicional (cinematograficamente falando) e você esquece dessa ideia de narrativa pelo simples fato da história ser realmente envolvente. 

Com o tripé Charlize-Margot-Nicole, vemos diferentes repartições profissionais, relações de trabalho e como elas atuam diretamente nas vidas das pessoas, passando ainda por importantes componentes políticos: vemos uma grande passada de pano para Donald Trump por parte da Fox News (o que obviamente não é surpresa), um prefeito de Nova York, Rudolph Giuliani (Richard Kind) que realmente se esforça para livrar o amigo abusador Roger Ailes, e as (quase patéticas) mulheres que passam a defender o “chefe”, chegando ao cúmulo de fazer camisetas de apoio. O tamanho do problema é inimaginável. Depois do estopim e primeira denúncia por parte de Gretchen, vemos a arma mais baixa do mundo masculino para desacreditar uma denunciante: compor seu perfil como “mulher vingativa que só quer dinheiro”. E tudo isso com um canhão da mídia nas mãos. Mas toda ação tem uma reação, e a onda voltou forte, com mais de 23 novos casos de abuso registrados desde que a Fox era Fox.

Um parágrafo necessário para a crítica desse filme é também todo delas: Charlize Theron e Margot Robbie. Charlize, quase não precisamos detalhar, ela entrega como sempre uma ótima atuação. É Margot Robbie o trabalho mais difícil. É com ela que teremos cenas de constrangimento total, e uma construção de personagem que realmente cresce com a história. E aprende com ela. Justíssima sua indicação ao Oscar.

Com caras e bocas, Nicole não foi tão marcante dessa vez

O Escândalo (Bombshell) mostra que a mudança cultural (é até triste constatar que é uma mudança cultural, afinal nunca deveria ser “da cultura da sociedade” este tipo de abuso e influência por poder) veio para ficar. Três mulheres (ou seriam mais de 23?) derrubaram o maior chefão da mídia dos Estados Unidos, dando um recado forte ao mundo. E, mesmo que se trabalhasse para varrer para debaixo do tapete essa página suja na história de uma das maiores empresas de comunicação do mundo, ela serve de exemplo (novamente infelizmente) para muitas empresas e mentalidades mundo afora. E que fique claro, que não se trata de direita, esquerda, ou centro. O Escândalo fala sobre crimes. E crimes sempre serão crimes. O direito das pessoas não é partidário.

Veredito da Vigilia

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