“Não se Preocupe, Querida” consegue criar tensão em um mundo perfeito
Não Se Preocupe, Querida (Don’t Worry Darling) o segundo filme de Olivia Wilde (Fora de Série) chega ao Brasil no próximo dia 22 de setembro e vem sendo notícia no mundo todo por suas polêmicas de bastidores. Ele foi exibido recentemente no Festival de Veneza, mas vem chamando atenção desde o início de sua promoção. O combo tem desde demissão desmentida (pelo ator Shia LaBeouf), entrega de documentos oficiais de custódia para Olivia durante a CinemaCon, e uma possível briga entre ela e a protagonista Florence Pugh. Quer queira, quer não, isso de certa forma ajuda a vender ou manter a atenção sobre o filme. Por fim, criou-se uma teoria de que o astro Harry Styles teria desferido uma cusparada no colega Chris Pine durante o festival, em um vídeo que ganhou as redes. Feita toda essa introdução, vamos então focar no filme, que é o que interessa por aqui.
Desde os trailers, sempre bem tensos, minha curiosidade sobre a obra foi crescendo. A minha primeira impressão é de que o longa teria uma certa semelhança de uso do mistério e do estranhamento que o virtuoso Jordan Peele imprimiu em Corra!, Nós e mais recentemente em Não, Não Olhe!. E realmente, de certa forma, o longa de Olivia Wilde consegue passar essa impressão logo de cara. O primeiro terço de Não se preocupe, Querida é promissor, com Florence Pugh (Midsommar e Adoráveis Mulheres) e Harry Styles vivendo em uma lua de mel colorida numa cidade de interior dos Estados Unidos. Eles vivem o clássico sonho americano dos anos 50 e 60, com casa sem muros, um amor incondicional entre eles, e toda a indumentária estilo pin-up que a época nos trouxe. Inclusive com seus belos cadillacs com rabos de peixe. Tudo ali nos joga para um mundo perfeito que, muito em breve, será confrontado.
Dentro do mundo perfeito da cidade chamada Vitória, uma grande empresa dá a segurança financeira para maridos talentosos. Ainda no mesmo molde do sonho americano, onde os homens são os provedores e as mulheres ficam cuidado das tarefas do lar, sempre de forma colorida e divertida, esperando seus amores com bebidas e uma janta deliciosa, as mulheres ainda tiram o dia para beber, colocar a conversa em dia e comentar quais serão as próximas aquisições para seus lares e armários. E nada melhor do que trazer o estranhamento para vidas que parecem perfeitas para colocar o grande conflito do filme. Vale ressaltar, que ele tem sim o texto, e subtexto, de uma mulher que quer sair de uma sociedade comandada por homens, mas está longe de ser um longa panfletário, ou como os nerdolas cunharam nos últimos anos, “lacrador”. O conflito principal ofusca esse tipo de necessidade e mantém a intriga em pé até seu final.
Os problemas dessa sociedade perfeita começam a aparecer no roteiro, que é regular, e até certo ponto seguro, mas muito superficial em suas explicações. Quando alguém questiona o que a grande empresa ou o que cada marido faz dentro dela, a resposta é quase risível. O teor do mistério aumenta com constantes tremores em casas ou shoppings, dando a entender que essa empresa pode estar causando algum grande dano na cidade, ou mesmo testando armas perigosas. Mas fica nisso.
A escolha dos atores foi acertada. Apesar de Harry Styles não entregar tanto como o marido Jack (está no máximo com uma atuação “ok”), Florence Pugh é quem leva o filme nas costas, tendo uma grande cena com o personagem de Chris Pine (ótimo na pele do “vilão”). Orbitam por eles a própria Olivia Wilde como a vizinha Bunny, Gemma Chan (Podres de Ricos, Eternos), Kiki Laine e Sydney Chandler.
A direção consegue nos deixar tensos (alguns movimentos de câmera ajudam bastante nisso), assim como cortes (ou recortes) de cenas que trazem o aspecto de estranheza ou de sonhos/pesadelos. Mas, Não Se Preocupe Querida perde força no momento principal, que é o da grande virada. Quando temos a maior revelação (não vou dar spoilers por aqui), sentimos que a entrega final fica muito a desejar, jogando por terra uma parte expressiva da construção de tudo o que vimos até ali. É uma saída que não consegue ser original e que outros filmes já fizeram com muito mais êxito. Isso deixa o filme ruim? Não, não chega a este ponto, mas justifica um pouco do porquê as polêmicas andam se sobressaindo ao próprio longa.