Mulher-Maravilha 1984 é lindo, mas faltou a história
Quanto maior a expectativa, maior a queda. A equação que mais se enquadra em Mulher-Maravilha 1984 é basicamente um clássico entre os cinéfilos. No entanto, é uma equação já muito bem resolvida pela Marvel Studios, mas que a DC ainda não conseguiu regular, e agora, parece longe disso. A estreia do novo longa de Patty Jenkins e Gal Gadot ainda carregava um aspecto de esperança por chegar ao final de um ano em que ficamos tão órfãos de grandes estreias e o nossos já confirmados blockbusters. Mulher-Maravilha 1984 acabou ganhando uma responsabilidade extra, quase simbólica, que não conseguiu sustentar. Tão pouco ostentar na tela grande.
Aliás, a tela grande nos Estados Unidos não foi tão possível assim. Por lá, o filme da Amazona estreou de forma simultânea nos cinemas (com restrições de público) e no streaming da HBO Max. No Brasil, a estreia foi no dia 17 de dezembro, nas praças que estivessem abertas. E essa mescla toda, com certeza, ainda fez com que muita gente deixasse de ver todo o esplendor de Gal Gadot e as cores de Mulher-Maravilha 1984 na tela grande, que ela deveria merecer. Deveria…
O novo filme começa com um acertado resgate da ilha de Themyscira – um dos pontos altos do primeiro filme e que merecia um filme inteiro. A introdução, entende-se depois, deveria ser a forma de incluir na jornada de Diana Prince (Gal Gadot) o ensinamento sobre a verdade, sobre não trapacear, que logo depois veremos como uma lição, mas que no final das contas, não parece muito convincente. Patty Jenkins usou quase uma hora de filme para a apresentação dos principais conflitos, e, mesmo assim, não conseguiu adequá-los a altura. O primeiro terço do filme nos deixa confusos sobre o ponto de partida e o ponto de chegada do filme. E logo depois, piora ainda mais a situação, oscilando os embates entre dois vilões que quase não nos causam preocupações.
Mas antes de chegar aos vilões, preciso destacar que estamos no ano de 1984 sem grandes preocupações de mostrar como saímos da primeira guerra mundial (em Mulher-Maravilha de 2017) e como o tempo que passou impactou a vida da nossa protagonista. Ela simplesmente existe, cumpre sua função como arqueóloga no museu Smithsonian, e faz uns “bicos” salvando a população de bandidos mequetrefes. O pretexto para usar os anos 80, seus visuais incríveis e sua trilha sonora, acabam dando um visual interessante, sempre com cores vivas que jogam a favor da história. Mas, infelizmente, nem só de estética vive o cinema.
Ao colocar no caminho de Diana Prince a também cientista Barbara Minerva (Kristen Wiig) e uma “pedra mágica”, vemos que a importância dada para os principais problemas que a heroína deveria enfrentar não são devidamente explorados. Usa-se a bengala da pedra mágica sem grandes explicações. Ela existe, e pronto. A partir dela, que funciona como uma realizadora de desejos, vemos se desenhar a origem dos poderes da Mulher-Leopardo, e do próprio Maxwell Lord (Pedro Pascal). Apesar da excelente escolha dos atores, o enredo é confuso e pobre, fora o fato de que a produção explora estereótipos de forma demasiadamente caricata em cada um deles. E essa mescla de cores e estereótipos nos remete ao fatídico Batman, de Joel Schumacher, uma lembrança que, por si só, já faz os fãs tremerem na base. E aqui, colocamos uma dose extra no personagem de Pedro Pascal pelo simples fato de não sabermos como é que os seus poderes funcionam, e a relação um tanto aleatória com seu filho Alistair.
O romance, que poderia ser um ponto forte da trama, entre Steve Trevor (Chris Pine) e Diana, também acaba esbarrando na bengala da magia. Ele só retorna dos mortos (um dos grandes mistérios) pelo desejo de Diana, que, privou-se da única coisa que amava desde os anos de 1918 (nunca superou?). Por mais que o arco de Trevor seja bem resolvido, não há como se imaginar que um homem fora de seu tempo faça as proezas que ele consegue. Voar em um caça, dirigir novos carros ou tanques, são só algumas delas. Em determinada cena, vemos ainda uma certa falta de originalidade: a Mulher-Maravilha combate alguns vilões enquanto Steve Trevor precisa encarar um só, em uma mescla da luta da Viúva Negra (em Homem de Ferro 2, com Happy Hogan) e a invasão de Noturno na Casa Branca (em X-Men 2). Faltou conhecimento de causa no roteiro e produção.
Mas fora a massaroca de roteiro que quer divertir e impactar, mas acaba somente ficando bobo, vemos cenas lindas. Principalmente as aéreas e as que indicam que a nossa heroína finalmente irá voar. A explicação ficou bonitinha, embora a DC tenha desperdiçado esse poder desde a primeira aparição de Diana em Batman vs. Superman. Vamos combinar que não precisava tanto tempo para que isso acontecesse. O final de tudo ainda é uma mescla com Lua de Cristal (os mais jovens que me perdoem a referência) onde além da “verdade salva”, temos o “tudo pode ser, se quiser será”.
Faltou alguma coisa? A armadura? Ah, outra oportunidade desperdiçada e jogada no roteiro, basicamente para uma homenagem na cena pós-crédito. Uma boa intenção, mas novamente, uma ideia mal executada.
Mulher-Maravilha 1984, ao final de tudo, não consegue carregar nas costas o fardo de filme do ano. Bem pelo contrário…