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As Marvels oscila entre a diversão e a vergonha alheia

Eis que chegou a hora de falar do 33º (é isso mesmo!) filme da Marvel Studios. E essa frase já carrega um peso por si só. Chegou a hora de falar de As Marvels (The Marvels). Talvez o primeiro filme da Casa das Ideias que chegue com um contexto amplamente desfavorável entre crítica e público. Afinal, antes de sua estreia, o assunto que tomou conta da bolha nerd é a estafa de filmes do gênero de super-heróis e uma impactante matéria da Variety citando, além dessa mesma estafa, uma série de erros cometidos pela Marvel Studios – que também podemos chamar só de Disney – em relação a produções para seu streaming e alguns de seus astros que estão quase ultrapassando a linha tênue entre amor e ódio na internet.

A avalanche negativa, talvez nunca vista pela Disney e seus filmes sob o guarda-chuvas da Marvel Studios, também acabou reverberando em vários sites (ditos especializados) ressaltando o próprio compilado do site norte-americano, que cita entre outras tantas coisas, a necessidade de um restart em séries e produções que já estavam em andamento. Fechando esse preâmbulo todo de contextos, há ainda as projeções de bilheterias, que estão bem desanimadas e a necessidade de ter o know-how dos outros 32 filmes e 14 séries (pegando por baixo) que já foram lançados desde o longínquo ano de 2008 (já são 15 anos!). O hype que normalmente orbita uma estreia da Marvel está, portanto, pela primeira vez, de cabeça para baixo. 

Mas e aí?

Com tudo isso, chegamos em As Marvels com o checklist de que o público consumidor deveria no mínimo ter: 1- conferido o primeiro filme da Capitã Marvel, 2- Vingadores: Ultimato, 3- WandaVision e 4- a série da Ms. Marvel. O pacote básico, só de largada. Obviamente somos nerds por aqui e já temos toda a bagagem necessária, mas o início do filme assinado pela diretora Nia DaCosta (do ótimo A Lenda de Candyman) já sofre com a necessidade de um quase “recap” para situar o espectador. Feito isso, ele entrega o que os trailers prometiam: uma aventura aleatória com a Capitã Marvel (Brie Larson), a Ms. Marvel (Iman Velani) e Monica Rambeau, ainda não oficialmente batizada no cinema (Teyonah Parris). 

Teyonah Parris em As Marvels
Teyonah Parris retorna, agora como a Capitã Monica Rambeau e muitos poderes.

O bom da coisa toda é que o filme não tem a necessidade das quase 3 horas de duração, o que vinha sendo quase que um pré-requisito para os últimos filmes de super-heróis. Nota do editor: atenção estúdios, não precisa! Com isso, As Marvels entrega uma sessão da tarde divertida, que vale a pipoca, mas que certamente vai dividir o público. Há que se ter em mente que o filme, apesar de trazer mais uma aba do já tão falado Multiverso, ele é pura e simplesmente uma “Sessão da Tarde”. E nisso inclui-se bons momentos de comédia oscilando entre vários momentos de suspensão de descrença e o clássico roteiro que segue a regra do “porque sim”. Certos rumos, ações e consequências tão somente vão percorrer um fluxo pela sua grande necessidade de conveniência. Não há lógica em muito do que estamos conferindo. Então, a dica é não se apegar a isso (sim, eu sei, às vezes é bem impossível). Se for difícil para você, não tem problema, eu entendo.

Nesse aspecto, As Marvels surfa muito na onda do que foi a segunda temporada de Loki. Muitas coisas acontecendo com explicações expostas nos diálogos, mas com aquela pitada de pseudo-ciência que na hora, nem dá pra ficar pensando muito se faz ou não faz sentido. Se você conseguir deixar isso de lado, ok, o filme vai fluir, e por mais bobinho que ele seja, ainda carrega uma aura inocente dos gibis que me fez rir em vários momentos. A trama é tão besta quanto, e enfraquece ainda mais os ocorridos em Invasão Secreta, trazendo problemas para o fã mais exigente: as três personagens estão com os poderes entrelaçados (porque sim) e precisam se unir para resolver uma quase-guerra intergaláctica (porque sim) com uma vilã Dar-Benn (Zawe Ashton) que emula Ronan, O Acusador (vivido por Lee Pace em Guardiões da Galáxia). E tudo claro, apenas porque sim!

Zawe Ashton as Dar-Benn
Zawe Ashton é Dar-Benn, mais uma vilã absolutamente esquecível do MCU.

Esses problemas estão no tom da coisa toda. Invariavelmente, a Marvel Studios migrou (ou migra) de um tom mais sóbrio, onde um soco, um golpe e um ferimento poderia realmente causar uma consequência nos personagens, para o tom mais cômico, quase cartunesco, onde a porradaria meio que ficou pasteurizada, ao ponto de Capitã Marvel e Ms. Marvel suportarem o mesmo “calor” da vilã (porque sim). Mesmo o perfil de vários personagens acaba se adaptando com o sub-gênero imposto no filme. Já vimos Nick Fury quase morrer e  já vimos a Capitã Marvel se torturar psicologicamente. Agora, em nome da comédia, seus contornos mais “dramáticos” por assim dizer, são jogados fora.

Embora divertido enquanto Sessão da Tarde – veja bem, eu gostei do filme -, As Marvels carrega consigo os maiores momentos de vergonha alheia do MCU. Tudo começa quando a Capitã Marvel descobre que precisa visitar um planeta onde todos se comunicam cantando (porque sim). Lá vemos o astro coreano Park Seo-joon (Parasita) em uma ponta quase que desnecessária (porque sim) como o Príncipe Yan, que em algum momento casou com Carol Danvers (porque sim). Uma roteirada para vermos Brie Larson ser chamada de Princesa da Disney (porque sim) e vestir, portanto, um vestido temático para vender bonecas (porque, né?). 

Brie Larson volta como Capitã Marvel
Apesar de grande atriz, parece que Brie Larson não conseguiu conquistar seu protagonismo no MCU

Soma-se a isso a sub-trama de Goose, o (gatinho) Flerken da Capitã Marvel que ainda vai render outras cenas um tanto quanto absurdas e insólitas, com o único intuito de inserir mais piadas (ou cortes para o TikTok e memes para a internet) quase que desnecessárias. É preciso, como eu disse, abraçar o absurdo por muitas vezes, mesmo que ainda estejamos em um filme de super-heróis (heroínas) de quadrinhos.

Os grandes momentos, como vêm se repetindo no MCU, fica por conta de seu desfecho, quando duas cenas pós-créditos me arrancaram dois bons sorrisos. Obviamente, como já esperamos depois de 33 filmes, apontando para um futuro com ainda mais … filmes e séries.

Com tudo isso, As Marvels não surpreende(em) e entregam o clássico filme “3 estrelas”, onde ele nem é tão bom, nem tão ruim, para que se possa amar ou odiar. Agora, com a pausa forçada da Marvel Studios, teremos um bom respiro até o próximo encontro com essas personagens. No final das contas, é uma distância que vai fazer bem. Para fãs e produtores. Precisamos de mais histórias e não só grandes eventos cheios de coincidências e conveniências de roteiro.

Em 2024, ficaremos apenas com Deadpool 3.

Prontos para a pausa necessária?

Veredito da Vigilia

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